2017/04/18

Dia 2373

Quando eu era pequeno, deitava no chão do quintal a noite. Era grande e amplo, sem cobertura. Uma área aberta e o céu se tornava o telhado do mundo inteiro. Sempre deitava de olhos fechados e esperava alguns segundos antes de abrir. Quando abria, parecia que estava caindo... Mas para cima. Com o tempo a gente vai esquecendo de fazer algumas coisas, como olhar o céu por exemplo.
Sinto falta de algumas coisas, algumas que nunca mais vão voltar principalmente do meu antigo eu. Sinto falta de coisas que nunca aconteceram também. Coisas que só eu sei. Esses dias olhei no espelho (de novo) e quase não me reconheci. Quem é esse cara usando minha escova de dentes? Que cara engraçado, tem uma barba esquisita.
Ir ao alto da montanha e gritar ao eco. Sentar na pedra e ver as plantas balançarem com o vento naquela mistura de verdes. Sentir a areia fofinha debaixo dos meus pés como se estivesse pisando em uma nuvem. Sinto falta das árvores e do cheiro de mato molhado pelo breu da noite. Ouvir o vento olhando o horizonte sem relógio no pulso. Subir os 590 degraus da escadaria do Santo Cruzeiro. Ver o sol nascer e se por também.
Rir mas rir de verdade e com gosto. Pão na chapa e café com leite. Tomar banho de chuva. Desenhos animados e um cobertor. Fazer um nova tatuagem. Tomar um chá gelado na Paulista. Jantar em um restaurante japonês na Liberdade a ChinaTown paulista. Sentar debaixo do vão do Masp e ver as crianças brincando. Tomar sorvete no Ibirapuera. Ver as luzes dos prédios na Brigadeiro Faria Lima. Tocar os lábios dela. Os lábios dela...
Eu poderia ser qualquer coisa, trabalhar duro. Um lenhador talvez, afinal a árvore não nega sombra nem a ele. Morar em uma cabana, usar flanela. Ter um cantil e deixar a barba crescer. Ouvir meus passos quebrarem os galhos secos. Canadá, e porque não? O grande porém dessa fantasia é que a probabilidade dela acontecer hoje é zero. A realidade é que estou sentado atrás de uma tela de computador, olhando o relógio do monitor e vendo quantos minutos faltam para a hora do meu almoço acabar.

Respire. Você vai ficar bem. Você já esteve desconfortável, ansioso e chateado antes e lembre-se, sobreviveu. Respire e saiba que você pode sobreviver a isso também. Esses sentimentos não podem destruir você e eles vão passar... Talvez não imediatamente, mas em breve, eles vão ser esquecidos e quando isso acontecer, você vai olhar para trás neste momento por ter duvidado de sua resiliência. Sei que é insuportável, mas continue respirando, de novo e de novo. Isso vai passar. Eu prometo que vai passar.
Meu bem, estou deitado de olhos fechados agora.

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