2014/03/22

Dia 1798

Ainda lembro de como era antes da barba serrada, das tatuagens e até do cabelo que perdi um pouco. Eu era só um garoto ferrado de 17 anos. Marcelo D2, O Rappa e Charlie Brown Jr faziam o Acustico MTV. Piadas de duplo sentido eram só piadas. Mas o mundo continuava idiota.
Sabe que, meu primeiro emprego foi de office boy. E pra um moleque como eu que ficava trancado dentro de casa porque a mãe protegia demais sair pelas ruas de São Paulo e descobrir as coisas era fantástico. A aventura do mêtro e linhas de onibus. Eu curtia. Adorava quando me perdia e ia parar em outro lugar desconhecido e de la descobria como voltar. E eu sempre voltava. Dai eu fiz 18, não achei la tão grande coisa assim... Era igual ter 17. A fantasia de 'agora eu posso as coisas porque fiz 18 anos' não veio pra mim. Isso é pura ilusao quando você com realismo. Se me perguntasse hoje o que sinto falta desse tempo eu diria que da cachorra Zara. Era a labradora do chefe e eu chegava uma hora antes pra vê-la. Parecia que ela sabia o barulho do meu all star preto andando na calçada. E vinha correndo. Até hoje, alguns anos depois ela ainda lembrou de mim e eu não esqueço dela. 
Bom, mas depois do acidente eu fiquei me questionando porque estou aqui. Afinal, que porra eu estou fazendo aqui? Eu nao queria passar a minha vida socado dentro de uma igreja pensando que tudo que faço e penso é pecado. Se eu sentir raiva das coisas erradas ou pensar em fazer amor com a minha mulher isso não me faz um pecados por favor... Por isso foi ai que nessa epoca eu decidi não ter religião. A religião é falha porque o homem é falho, simples assim. Dai, algumas coisas mudaram depois daquele fim de ano de 2011. Olhei mais atentamente o céu, vi mais estrelas do que estava acostumado a ver. Eu amadureci 20 anos ali. E nisso mudei minha vida toda. A tive que aprender a fazer nó em gravata. Dessa parte se me perguntassem do que sinto falta, diria que das estrelas. De sair correndo as 18hs pra pegar o onibus e sentar na escada da garagem da escola. Que depois viraram passeios por ruas pequenas e depois conversas na praça. Ali eu aprendi a ser simples, a ser honesto e a ser eu mesmo. Mas nem tudo dura, embora algumas lições a gente leve conosco. E ai mais um ano terminou. Só que algumas coisas mudaram. Eu comecei a olhar no espelho como se eu fosse outro alguém. Foi nesse tempo que eu pensei que poderia marcar o tempo na pele e os primeiros desenhos apareceram. Conheci muita gente, gente que hoje talvez nem lembre direito do meu rosto. Talvez.
Era a parte que eu nao conseguia dormir. Que eu virava a noite em bares tentando encontrar olhares e sorrisos e voltava pra casa mais sozinho do que tinha ido. Ás 4 da manhã eram crueis. Mas, se me perguntasse o que lembro desse tempo diria que do pôr do sol. E nunca, em nenhum lugar vou encontrar um pôr do sol como aquele. Tanto que, se tornou meu lugar secreto. 

E aquela garota usando saia longa, roxa-roxa e enquanto ela andava as folhas grudavam no tecido. Ela teve que subir um pouquinho pra conseguir andar sem ter uma floresta na ponta daquele roxo todo. Ela dizendo outro dia "eu só estou aqui porque você vinha, se não eu nao estava aqui agora". E a minha perna servindo de encosto pra uma conversa longa sobre historia, museu, amor e outras coisas, outras vidas... E depois disso virou uma sucessão de noites sentado no alto do prédio fumando um beck pra depois vendo a cidade inteira dormir la de cima. E lá de cima eu me perguntava também "mas o que eu estou fazendo aqui?". Como se a noite fosse me responder. E você vai me perguntar o que lembro desse tempo, e eu diria que o coelho da lua vista 25 andares acima do chão. 

Bom, a partir daqui eu paro. Lembra dos caminhos? Aqueles do começo? Olha como os valores mudam, a gente evolui, cresce, amadurece. Quando eu tinha 17 queria conquistar o mundo. Com 22 depois de conhecer o mundo como ele é tenho medo de descobrir mais alguma coisa dele. E as pessoas? As pessoas são os outros sonhos, os outros planos... Eu sou uma coleção de memórias, aromas, gostos, etc. A cabeça nao para e sabe o que preciso? Paz. Dois dobrões pro primero que aparecer com a receita de paz.
Sabe, eu posso ter crescido, mudado alguns conceitos e evoluido mas eu ainda adoro olhar o céu. 
Eu vou, mas eu volto. Eu sempre volto. Na verdade nunca fui embora sabe? Eu sempre estive aqui. 
Já sentiu em algum momento da sua vida aquele momento que você queria dar pause? Chega de dar play. Agora é no pause.
Então, que toque a musica pra vida inteira.

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